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Genética Molecular das Imunoglobulinas

Université de Montpellier et Laboratoire d'ImmunoGénétique Moléculaire, LIGM, UPR CNRS 1142, Institut de Génétique Humaine,
141 rue de la Cardonille, 34396 Montpellier Cedex 5 (France)
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E-mail Marie-Paule.Lefranc@igh.cnrs.fr, IMGT: http://www.imgt.org
Tradução para o português brasileiro:
Prof. Geraldo A. S. Passos
Universidade de São Paulo
Campus de Ribeirão Preto, SP, Brasil.
E-mail: passos@usp.br

Como citar este artigo

Introdução

As imunoglobulinas (figura 1) compreendem duas cadeias pesadas idênticas associadas a duas cadeias leves idênticas, kappa ou lambda. No homem, os genes das cadeias pesadas (locus IGH), os genes das cadeias leves kappa (locus IGK) e os genes das cadeias leves lambda (locus IGL), estão respectivamente situados nos cromossomos14 (14q32.3), 2 (2p11.2) et 22 (22q11.2). A síntese das imunoglobulinas necessita dos rearranjos dos genes dos loci IGH, IGK e IGL durante a diferenciação dos linfócitos B.

  1. Síntese das cadeias leves kappa e lambda
  2. Tomemos, como exemplo, a síntese das cadeias leves que nos permite, por sua relativa simplicidade, familiarizarmos com os processos de rearranjos do DNA e de maturação do RNA mensageiro. Cronologicamente entretanto, nas células pré-B, a biosíntese da cadeia pesada precede a da cadeia leve.

    1. Rearranjo V-J dos loci IGK e IGL

      O locus kappa (IGK) e o locus lambda (IGL) comportam numerosos genes variáveis (V): no homem o locus IGK compreende 76 genes IGKV dos quais 34 a 37 são funcionais e pertencem a 5 sub-grupos, o locus IGL compreende 70 a 74 genes IGLV dos quais 29 a 35 são funcionais e pertencem a 10 sub-grupos. Cada gene V codifica a maior parte da região variável de uma cadeia leve (V-REGION) (94 a 108 aminoácidos dependendo do gene, além de quatro aminoácidos do peptídeo sinal (L-PART 2). O restante (15 a 18 aminoácidos) do peptídeo sinal é codificado por um pequeno segmento de DNA (L-PART 1) situado na posição 5' e separado de cada gene V por um pequeno íntron de 100 a 400 pares de bases (o peptídeo signal permite a passagem da a cadeia leve na cavidade do retículo plasmático e é em seguida eliminado por uma peptidase). Os últimos resíduos de aminoácidos (12o. e 13o.) da região variável das cadeias lambda e kappa, respectivamente, são codificados por um gene da junção (J). Existem cinco genes IGKJ situados em 3' dos genes IGKV e a 2,5 kilobases (kb) em 5' do unico gene IGKC que codifica a region constante (C) da cadeia leve kappa. A situação é diferente para o locus lambda onde sete genes IGLC foram detectados em tandem numa distância de 50 kb. O número de genes IGLC varia no homem, de 7 a 11, dos quais 4 ao menos são funcionais e responsáveis pelos isótipos Mcg, Kern¯Oz¯, Kern¯Oz+ e Kern+Oz¯. CCada gene IGLC funcional é precedido em 5' por um gene IGLJ situado a 1,5 kb.

      Nos linfócitos B que exprimem imunoglobulinas de membrana e nos plasmócitos produtores de anticorpos, onde a síntese de cadeias leves é bastante ativa, um gene V é contíguo a um gene J : esta junção V-J resulta num rearranjo de seqüências de DNA correspondentes que se acompanha da deleção do fragmento inicialmente presente entre estas duas seqüências V e J (figura 2).

      O rearranjo V-J se faz graças a sinais de junção heptâmero-nonâmero (figura 3) reconhecidos pela enzima recombinase. Cada gene V é seguido por um heptâmero de seqüência CACAGTG e um nonâmero de seqüência consenso, ACAAAAACC, separados por um intervalo de 12 nucleotídeos. Da mesma forma, os genes J são precedidos por um nonâmero de consenso GGTTTTTGT e de um heptâmero de consenso CACTGTG, separados por 23 nucleotideos. Os sinais heptâmero-nonâmero em 3' dos genes V são seqüências complementares dos sinais heptâmero-nonâmero em 5' dos genes J. Além disso, as seqüências dos heptâmeros apresentam uma estrutura palindrômica.

      Os rearranjos eficazes têm lugar logo que permitem intervir dois sinais de junção, um dos quais tem um intervalo de 12±1 nucleotídeos e o outro de 23±1 nucleotídeos entre o heptâmero e o nonâmero (regra dita 12/23). Veremos mais adiante que os sinais de junção idênticos são observados para o rearranjo de genes do locus IGH.

      A diversidade considerável de regiões variáveis das cadeias leves das imunoglobulinas se explica:

      • ao nível germinativo:
        • pelo grande número de genes V, o tamanho das famílias multigênicas IGLV e IGKV podem por sí, variar devido a recombinações desiguais intergênicas;
        • pelas conversões gênicas e provavelmente também pelas recombinações iguais e desiguais intragênicas que ocorrem dentro das famílias multigênicas V;
      • ao nível dos rearranjos:
        • pelo grande número de combinações V-J (diversidade "combinatoria") ;
        • por uma flexibilidade do sítio de corte em 3' do gene V (1 ou 2 nucleotídeos antes do último códon)
        • enfim, por mutações somáticas pontuais que aparecem logo que ocorre a maturação do linfócito B e afetando os genes V e os segmentos J rearranjados.

      No homem, a diversidade combinatória das cadeias kappa é da ordem de 155 a 175 combinações V-J (31 a 35 genes IGKV funcionais e 5 genes IGKJ). No caso das cadeias lambda, a diversidade combinatoria é da ordem de 116 a 165 (29 a 33 genes IGLV funcionais e 4 a 5 genes IGLJ funcionais). Mas considerando a flexibilidade das junções V-J e das mutações somáticas esta cifra pode ser multiplicada nos dois casos por 1000, possibilitando um total de 105 cadeias leves.

    2. Transcrição de um gene variável rearranjado V-J e de um gene C

      Um gene variável rearranjado IGKV-J e o gene IGKC (caso de uma cadeia kappa), ou um gene variável rearranjado IGLV-J e o gene IGLC quer dizer a montante do gene J rearranjado correspondente (caso de uma cadeia lambda) é transcrito em um pré-mensageiro. As seqüências de RNA correspondentes aos íntrons e eventualmente aos genes J supérfluos são em seguida excisados por processamento de maneira a produzir um RNA mensageiro maduro (ver figura 2). Este é então traduzido em uma cadeia leve.

  3. Síntese de uma cadeia pesada µ
    1. Rearranjos D-J seguido de V-D-J do locus IGH

      A região variável da cadeias pesadas é formada da mesma maneira das cadeias leves mas as possibilidades de diversidade são ainda superiores. As seqüências nucleotídicas suplementares, D para Diversidade, situadas entre os genes V e os genes J, participam da biosíntese das regiões variáveis e codificam a terceira região hipervariável (CDR3) (seu tamanho heterogêneo explica as variações de comprimento observadas nesta região). Na configuração não rearranjada dita "germline", encontramos os sinais de junção heptâmero-nonâmero em 3' dos genes IGHV, de uma parte e de outra genes D e em 5' genes J. Os sinais heptâmero-nonâmero dos genes IGHV e dos genes IGHJ estando separados por 23 nucleotídeos e os genes IGHD estando separados de 12 ou 13 nucleotídeos, a regra 12/23 é respeitada (ver figura 3).

      Logo que ocorre a diferenciação dos linfócitos, dois rearranjos de DNA são também necessários para a síntese de uma cadeia pesada pelas células pré-B: junção de um dos genes D a um dos genes J, depois junçãode um dos genes V à combinação D-J (figura 4). Os rearranjos envolvem preferencialmente certos genes IGHV, IGHD e IGHJ nos primeiros estágios da diferenciação dos linfócitos B. O duplo rearranjo D-J e V-D-J aumentando o número de combinações possíveis aumenta da mesma forma a diversidade das regiões variáveis das cadeias pesadas. Além disso, os genes D sequenciados até hoje, apresentam duas ou três seqüências ORF (ou seja, sem stop codon) aumentando também a diversidade das cadeias pesadas. Enfim, a comparação das seqüências dos genes D de células indiferenciadas e de células produtoras de anticorpos mostra que freqüentemente um a vários nucleotídeos da seqüências original são ausentes e que, inversamente nucleotídeos suplementares (com freqüência G ou C) são acrescentados às junções V-D e D-J das cadeias pesadas, formando também regiões ditas regiões N. Considerando estas observações, Alt e Baltimore propuseram um modelo para a junção D-J. Numa primeira etapa, os dois genes D e J são alinhados graças a proteínas que se ligam ao DNA. Os quatro segmentos de DNA são cortados exatamente na extremidade dos sinais heptâmeros adjacentes às seqüências codificadoras D e J. Os genes D e J são então unidos um ao outro, os heptâmeros igualmente. Estes são em seguida eliminados sob a forma de um círculo de excisão como já foi demonstrado por meio de isolamento deste tipo de DNA circular. Uma exonuclease agindo nos pontos de corte dos dois outros segmentos, portadores um de D, outro de J, encurtaria as seqüências D e J de alguns nucleotídeos.

      A enzima desoxinucleotidil terminal transferase (dTT) poderia então acrescentar desoxinucleotideos às extremidades 3'. Uma DNA-polimerase replicaria as bases acrescentadas (região N) e a junção seria completada pela ação de uma ligase. Tal modelo é também válido para a junção do gene V ao complexo D-J. A razão de que raramente são acrescentadas bases suplementares em seguida à junção dos genes das cadeias leves é devido ao fato que a junção V-J dos loci IGK e IGL ocorre mais tarde do que a junção V-D-J do locus IGH durante a diferenciação das células B, quando não há mais atividade da dTT nestas células.

      QUESTÃO
      O que são os nucleotídeos P?
      Em que tipo de seqüências eles são observados?

      Os genes rearranjados são submetidos a mutações somáticas pontuais. Estas não são limitadas aos genes V e são observadas também nos genes D e J e parece que as respostas primárias tardias são acompanhadas de mutações pontuais muito mais numerosas resultando numa possível seleção de anticorpos mais com maior afinidade para com os antígenos.

      No homem, o locus IGH compreende 123 a 129 genes IGHV segundo os haplotipos, dos quais 38 a 46 são funcionais e pertencem a 6 ou 7 sub-grupos. Vinte e sete genes D, dos quais 23 funcionais e nove genes JH, dos quais seis funcionais, foram descritos. Os rearranjos permitem produzir em torno de 6 300 recombinações (38 a 46 x 23 x 6). Este número poderia ser multiplicado por um fator de 104 contando com as regiões N, com os diferentes modos de leitura dos genes D e com as mutações somáticas. Um organismo dispõe então de um repertório potencial de mais de dez milhões (107) de cadeias pesadas e, no total, considerando as cadeias leves, de 1012 anticorpos diferentes. O limite deste repertório teórico considerável é, de fato, o número de linfócitos B de que dispõe um indivíduo.

    2. Transcrição de um gene variável rearranjado V-D-J e do gene Cmu (IGHM)

      Um gene variável rearranjado V-D-J e o gene Cmu (IGHM) é transcrito em um pré-mensageiro. As seqüências de RNA correspondentes aos íntrons e eventualmente aos genes J supérfluos são em seguida excisados por processamento produzindo um RNA mensageiro maduro. Este é então traduzido numa cadeia pesada µ. A diferenciação do linfócito começa pelo aparecimento de cadeias µ no citoplasma de um linfócito pré-B (figura 5). A cadeia µ é associada, nos linfócitos pré-B, a dois polipeptídeos, a cadeia V-pré-B e uma cadeia tendo homologia com a região constante das cadeias leves lambda. Esta cadeia é chamada lambda5 no camundongo e lambda-like no homem. O conjunto V-pré-B e lambda5 (ou lambda-like) constitue a pseudo-cadeia leve ("surrogate chain") que, com a cadeia µ, forma o receptor pré-B. A ativação do receptor pré-B inicia, de uma parte, a parada dos rearranjos do locus IGH e, de outra parte, o começo dos rearranjos do locus IGK. O linfócito pré-B se diferencia então em linfócito B imaturo exprimindo IgM de membrana nas quais a pseudo-cadeia leve é substituída por uma cadeia leve kappa ou lambda.

  4. Síntese de uma cadeia pesada δ (delta) : processamento diferencial de um transcrito V-D-J-Cµ-Cδ
  5. No curso de sua diferenciação, o linfócito B imaturo se tranaforma num linfócito B maduro que exprime simultaneamente IgM e IgD de membrana (ver figura 5), as cadeias µ e δ destas duas classes tem uma região V-D-J identica dirigida contra o mesmo antígeno. Isto pode ser explicado pela síntese de um longo transcrito V-D-J-Cµ-Cδ de quase 20 kb, a distância que separa os genes IGHM et IGHD (ver figura 7) sendo que no homem é de 6 kb. Um RNA mensageiro maduro V-D-J-Cδ é obtido por processamento diferencial de um transcrito primário V-D-J-Cµ-Cδ. O RNA maduro é em seguida traduzido em uma cadeia pesadaδ. As IgD poderiam ser obtidas igualmente em seguida de uma comutação de classe (ou switch) fazendo intervir uma seqüência degenerada de switch situada entre os genes Cmu e Cdelta.

    Um RNA mensageiro maduro V-D-J-Cδ é obtido por processamento diferencial de um transcrito primário V-D-J-Cµ-Cδ. O RNA maduro é em seguida traduzido em uma cadeia pesada δ.

  6. Síntese das cadeias pesadas γ (gama), ε (epsilon) e α (alfa) : comutação de classe
  7. Logo em seguida de sua maturação, o linfócito passa de uma produção de IgM e IgD a síntese de IgG ou de IgE ou de IgA (ver figura 5). CEste processo, que permite a mudança da região constante da cadeia pesada mantendo a mesma especificidade do anticorpo e mesmo reforçando sua afinidade. Este processo é chamado de "comutação" de classe (ou "switch"). A interação entre CD40 e CD40L (CD154) é indispensavel a realizaçào do switch e da hipermutação somática que envolve a atividade de uma citidina deaminase específica dos linfócitos B ativados.
    Isto nos faz supor que recombinações colocam o conjunto V-D-J rearranjado, previamente associado ao gene IGHM, próximo de cada um dos outros genes constantes do locus IGH (figura 6).

    Estas recombinações sào possíveis pela existência a aproximadamente 2 kb em 5' de cada um dos genes IGHC de seqüências particulares, que devido sua participação no mecanismo de comutação de classe, são chamadas de seqüências S (SWITCH). Estes sinais, de aproximadamente 2 kb, são compostos de 20 a 80 bases repetidas em tandem. No interior destes "motifs", observamosvárias seqüências curtas repetidas GGGGT e GAGCT e, próximo do sítio de comutação, seqüências TGGG ou TGAG. Enfim seqüências chi, GCTGGTGG, promotores da recombinação generalizada do fago lambda, foram descritas nas seqüências S de recombinadas de camundongos, sem que possamos precisar seu significado funcional no locus IGH. A homologia entre Smu e as regiões Salpha e Sepsilon é mais importante que aquela existente entre Smu e Sgama3, sendo esta última a mais homóloga a Smu. Esta homologia, menor entre Smu e Sgama, não impede entretanto, o switch Smu-Sgama ; se uma nova comutação acontece, é com uma probabilidade grande que um outro gene Cgama (IGHG) será envolvido em razão de sua formação, seguida do primeiro switch, de uma seqüência recombinada Smu-Sgama que apresente, por causa disto, uma homologia importante com outras seqüências Sgama. Citocinas específicas da comutação de classes ou sub-classes foram descritas: por exemplo, IL4 para o switch de IgG4 e IgE, TGF beta para IgA1 e IgA2.

    É possível que recombinases específicas de classes e de sub-classes reconheçam as seqüências S correspondentes, por exemplo Smu e Salfa, ligando-se a tais seqüências, permitem a justaposição e a recombinação Smu-Salfa. Mas é possível que uma recombinase reconheça seqüências curtas homólogas a todas as regiões S.

    A comutação de classe acontece graças a estas regiões S e permite a deleção dos genes IGHC situados entre o conjunto V-D-J e entre o gene IGHC utilizado (figura 6).

    CEstes se produzem pela formação de alças de deleção, logo que ocorre o rearranjo entre a seqüência Smu e uma outra seqüência S (Sgama por exemplo, no caso da comutação IgM-IgG). Logo que acontece uma nova comutação, este gene Cgama sera por sua vez eliminado e substituído por um outro gene IGHC localizado mais em 3'.

  8. Imunoglobulinas de superfície e imunoglobulinas secretadas
    1. Cadeias µ de membrana e secretadas

      De uma maneira geral, as cadeias pesadas de imunoglobulina de superfície (ou de membrana) dos linfócitos B têm uma região C-terminal hidrofóbica que as matêm ancoradas à membrana plasmática enquanto que as imunoglobulinas secretadas pelos plasmócitos têm uma extremidade hidrofílica. A região C-terminal das cadeias µ de membrana (figura 7) é codificada por dois pequenos exons, M1 e M2 situados a aproximadamente 2 kb em 3' do exon CH4; M1 codifica 39 aminoácidos, M2 codifica somente 2. Estes 41 aminoácidos representam o conjunto do dispositivo de ancoragem das cadeias µ de membrana que compreendem uma região extracelular entre a extremidade do domínio CH4 e a membrana, uma região transmembranar hidrofóbica de 25 aminoácidos e uma curta região citoplasmática de 3 aminoácidos. A região C-terminal das cadeias µ secretadas compreende 20 aminoácidos codificados pela extremidade 3' do exon CH4 (designado por CHS no IMGT).

      A expressão de uma cadeia µ de membrana supõe a utilização de um sítio poli A situado em 3' do exon M2 e, durante a maturação do pré-RNAm, a utilização de um sítio de processamento situado no interior do exon CH4, no limite 5' do segmento CHS. Este processamento suprime também CHS e seu stop codon além de toda a região compreendida entre CH4 e M1. Na síntese de uma cadeia µ de IgM secretada, é o sítio poli A situado a 103 bases da extremidade 3' de CH4 e o stop codon na extremidade 3' do exon CH4 que são utilizados (figura 7). Uma mesma célula pode então apresentar os dois precursores de RNA µ e a expressão relativa de IgM de membrana e IgM secretada dependeria de um controle ao nível da seleção do sítio poli A utilizado. O RNA mensageiro da cadeia µ secretada poderia também ser originado de um processamento diferencial do longo transcrito da cadeia µ de membrana.

    2. Cadeias δ (delta) de membrana e secretadas: maturação diferencial do RNA mensageiro

      A região constante da cadeia δ é codificada pelo gene IGHD. A organização da região 3' do gene IGHD humano é a seguinte: um pequeno exon CHS situado a 1,8 kb em 3' do exon CH3 codifica os 8 últimos aminoácidos das cadeias δ secretadas; dois outros exons M1 e M2, situados respectivamente a 0,8 kb e 1,3 kb em 3' de CHS, codificam a região de ancoramento na membrana e a região citoplasmática; M1 codifica 52 aminoácidos enquanto que M2 codifica 2 aminoácidos. Uma outra particularidade do gene IGHD humano é a existência de 2 exons para a região da dobradiça: H1 codifica os 34 primeiros aminoácidos 2 les 24 suivants, os dois últimos aminoácidos (cisteína e prolina) sendo codificados pelo início do exon do domínio CH2.

      O controle da expressão das IgD de membrana e das IgD secretadas se faria, como para as IgM, ao nível da maturação deste mensageiro e da seleção dos sítios poli A em 3'. A síntese de uma cadeia δ supõe que, durante o processamento, uma região importante do transcrito correspondente a IGHM seja eliminada. A síntese da cadeia d de membrana pode se explicar pela utilização do sítio poli A em 3' do exon M2 do gene IGHD. A síntese de IgD secretada supõe a utilização do sítio poli A em 3' de CHS.

  9. Exclusões alélicas e isotípicas, cronologia dos rearranjos
  10. Os linfócitos B maduros, e os plasmócitos que derivam destas células, mostram os seguintes fenômenos:

    • exclusão alélica, quer dizer que, na quase totalidade dos casos, os únicos genes funcionais das IG são, os do cromossomo paterno ou do cromossomo materno, jamais os dois ao mesmo tempo (haploidia funcional);
    • exclusão isotípica, quer dizer que eles sintetizam um único tipo de cadeia leve, kappa ou lambda, e uma única classe ou sub-classe de cadeia pesada.

    Os mecanismos destes fenômenos são ainda pouco conhecidos e a explicação ainda imperfeita. Entretanto, os estudos de hibridação molecular mostraram que o alelo excluído não está rearranjado, foi rearranjado de maneira não produtiva ou é às vezes deletado. O isótipo excluído pode ser não rearranjado (caso do locus IGL nas células que sintetizam cadeias kappa), ou deletados ou rearranjados de maneira ineficaz (caso do locus IGK nas células que sintetizam cadeias lambda).

    Durante a diferenciação de um linfócito B, o locus IGH de um dos cromossomos 14 passa em primeiro lugar por um rearranjo D-J e depois V-D-J. Um rearranjo produtivo permite a síntese de cadeias pesadas m no citoplasma das células pré-B. As cadeias m são expressas na superfície das células pré-B em associaçào com uma cadeia lambda-like e uma cadeia V pré-B (figura 8). A aparição de IgM de superfície, num estado de diferenciação ulterior, supõe a síntese das cadeias kappa ou lambda habituais, quer dizer um rearranjo V-J produtivo dos loci IGK ou IGL. Cronologicamente os rearranjos V-J do locus IGK precede aos rearranjos do locus IGL. Um dos cromossomos 2 será primeiro rearranjado. Se o rearranjo V-J assim obtido é produtivo, cadeias leves kappa serão sintetizadas, o que permitirá a produção de IgM funcionais, o outro cromossomo 2 assim como os dois cromossomos 22 permanecem não rearranjados. Se o primeiro rearranjo não é produtivo, o outro cromossomo 2 depois os cromossomos 22 serão rearranjados por sua vez até a aparição de um rearranjo que permita a síntese de uma cadeia leve. É a aparição de um anticorpo funcional na superfície do linfócito B que é o sinal que impede outros rearranjos V-J.

    Em resumo, numa célula produtora de anticorpo, só um cromossomo 14 é produtivo (quer dizer, que possibilita a expressão de uma cadeia m funcional) e só um cromossomo 2 ou 22 é rearranjado de maneira eficaz (que permita a síntese de uma cadeia leve kappa ou lambda). Os genes de IG nos outros cromossomos, não são rearranjados, ou são rearranjados mas não produtivos ou até são deletados.

  11. Regulação da expressão de genes de Ig: activadores da transcrição
  12. Para que haja a síntese de cadeias pesadas e leves completas de Ig, é necessário que haja um rearranjo prévio V-D-J do locus IGH e V-J de um dos loci IGK ou IGL, os conjuntos V-D-J-Cµ do locus IGH e V-J-C dos loci IGK ou IGL são então transcritos. A taxa de transcrição fraca nos primeiros estágios de desenvolvimento da célula B se tornam em seguida bastante elevados nos plasmócitos resultantes da proliferação clonal.

    Os genes V possuem uma seqüência promotora em 5' de sua seqüência sinal e são transcritos antes de seu rearranjo; esta transcrição, que corresponde a uma abertura da cromatina e então a uma melhor acessibilidade ao DNA, fica entretanto fraca. Os transcritos de genes C que são sintetizados na ausência de rearranjos são degradados no núcleo. Logo que ocorre o rearranjo, originando um conjunto V-J-C no locus IGK ou V-D-J-Cµ no locus IGH ativo, a seqüência em 5'do gene IGKV ou IGHV não é modificada mas se encontra próxima a seqüências situadas em 3' dos genes IGKJ e IGHJ. É aí que a presença dos ativadores da transcrição (ou "enhancers") foi demonstrada pela primeira vez no DNA de células eucarióticas. Por estratégias diferentes vários grupos de pesquisa demonstraram simultâneamente que um segmento de DNA, situado entre o gene IGHJ e mais em 3' da seqüência de switch Smu é não somente capaz de aumentar a transcrição, mas possui as propriedades dos ativadores descritos nos vírus. Estes ativadores podem ativar a transcrição, qualquer que seja sua orientação e sua posição em 5'ou 3'em relação ao promotor do gene, mas eles só agem nos promotores cis, quer dizer situados no mesmo cromossomo; eles podem igualmente agir in vitro sobre outros genes e aumentar sua transcrição, mesmo se estão situados a vários kb do gene.

    Durante a comutação de classe, o ativador, localizado a mais de 1 kb em 5' da seqüência Sm não é eliminado e pode ser utilizado para expressão de todas as classes e sub-classes de cadeias pesadas (voir figura 6). A presença de um ativador assim, também foi demonstrada entre o gene IGKJ e mais em 3' entre o gene IGKC. A junção V-J ou V-D-J diminuindo a distância entre o promotor do gene V e o ativador permitiria a interação de fatores que se ligam a estas seqüências, com por conseqüência, uma transcrição importante do conjunto rearranjado V-J-C ou V-D-J-Cµ. Os outros genes V situados em 5' do gene rearranjado, estando muito longe do ativador ficam inativos. Um segundo ativador foi descrito em 3' do gene IGKC e do gene IGHC o mais em ajusante (IGHA no camundongo, IGHA2 no homem). Um ativador foi igualmente localizado no locus IGL humano em 3' de IGLC7 o gene mais em ajusante.

    A propriedade mais interessante do ativador dos genes de IG é sua propriedade tissular. Bastante ativo nas células que normalmente são capazes de produzir anticorpos (células da linhagem linfóide B), é ao contrário inativo (ou sua atividade é fortemente diminuída) nos fibroblastos da mesma espécie.

    Tal especificidade é o resultado de fatores, presentes somente nos linfócitos B, específicos de certas seqüências do ativador e capazes de regular a expressão de genes das IG durante a diferenciação destas células.